quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

C'est la vie - #28

Achei a escola super pequena e triste. Imaginei um miúdo indefeso no meio de um grupo de rapazes altos e maus, a levar murros e pontapés. Sem ninguém que o pudesse ajudar. Fiz disso uma piada e contei-a para o meu irmão se animar um pouco, mas de facto, era isso que pensava. O que será que iam achar ou pensar as pessoas daquela escola? Será que iam rir das nossas roupas? Ou simplesmente, iriam ter curiosidade em saber algo sobre nós e sobre a nossa língua?
Seria ali que iria passar o maior tempo dos meus dias, naquele sítio sombrio e aborrecido. A biblioteca também não parecia interessante. E isso desiludiu-me bastante porque quando precisava de pensar e abstrair-me das coisas ao meu redor, refugiava-me na biblioteca da escola a ler um livro ou simplesmente a ouvir música... E agora? O que iria fazer naqueles dias em que acordava cheia de dúvidas a precisar de um sítio quente e confortável para ler ou pensar?!
Pelos vistos, não seríamos muitos portugueses na mesma turma. E saber lá se eles sempre vinham ou se eram simpáticos? E se não fossem? Como me ia desenrascar quando não percebesse alguma coisa? Estava com medo e as dores de cabeça não ajudavam para ansiedade do primeiro dia. Afinal, ia começar tudo de novo...
Fizémos a inscrição e ficámos a saber que não teríamos nenhum professor a traduzir-nos as aulas. Os dias passavam-se e eu aguardava ansiosamente pelo dia 3 de Setembro.
Quando finalmente chegou, acordei depois de uma noite quase em claro, vesti uma camisa lilás, umas calças justas e claras e calcei os meus Vans roxos para combinar. Levei o material que já tinha na minha mala preta e coloquei o meu colar do moustache. A minha mãe disse e explicou-nos como era o caminho do tramway e lá fomos nós.
À porta estavam miúdos de 5º ano super agitados para entrar. Não percebia o porquê de estarem tantos miúdos mais novos ali e não os matulões do 9º ano. Pensei logo que nos tinhamos enganado na hora da apresentação.
Abriram-se aquelas portas enormes e aparentemente pesadas e surgiu uns sorrisos a saudar as crianças que entravam. Pelo o que via, estavam a pedir as cadernetas cor-de-laranja forte que simbolizavam que éramos do mesmo colégio. Nós não tínhamos a nossa, mas entrámos na mesma. Fui directamente confirmar a hora da apresentação e achei que estávamos errados, então liguei à minha mãe. Ela insistiu dizendo que estávamos na hora certa. Aborrecida, dirigi-me ao átrio onde muita gente já estava reunida. Um homem alto, super snob, de fato cinzento, gravata azul escura e óculos rectangulares, estáva no meio do semi-círculo que ali se formava. Eu o meu irmão fomos sorrateiramente para as últimas filas. Ele, então começou por dar uma introdução super secante que não entendi nada e depois, começou a chamar nomes. Estava inquieta, queria ouvir o meu nome. Cada vez ficava menos gente ao nosso lado, cada vez menos... Até que ficam mais ou menos, 10 pessoas ali. Eu e o meu irmão estávamos incluídos, mais duas raparigas que estavam à nossa frente e outros do outro lado. Foi então que ele anunciou (em francês, claro): "Classe de Acolhimento". Depois de alguns nomes, veio então, o meu longo nome.

sexta-feira, 29 de novembro de 2013

C'est la vie - #27

Acordei, depois de um sono profundo. Olhei em meu redor e estava numa casa iluminada pelo sol natural da manhã. Vi a minha guitarra e apercebi-me que estava exactamente no mesmo sítio que adormeci. A minha mãe veio ao meu encontro e perguntou num tom amável: "Então dorminhoca, dormis-te bem?" Acenei que sim e mentalizei-me que esta seria a minha nova casa, seria a minha nova vida. Tinha umas quantas mensagens do David a dizer que me amava e etc. Mas decidi desligar o telemóvel. Ignorar o passado e respirar o presente. Talvez podesse abstraír-me da distância que me separava dos meus amigos e me magoasse menos.
Acontece que, olhava para um sítio lembrava-me de uma esquina algures na minha cidade natal, inspirava ar que por ali pairava e recordava-me dos bons momentos em campo com os Escuteiros... As recordações vinham sempre ao de cima, mas com o tempo fui deixando-as guardadas no meu peito começar a habituar-me à rotina. Estava a começar a gostar muito de estar neste novo lugar... E a ansiedade de entrar na nova escola, aumentava a cada minuto que passava. Então, nesse dia a minha mãe decidiu que iríamos tratar daquilo que tinhamos para tratar, na nova escola... Estava nervosa. Mas feliz... Era a segunda vez que mudava de escola. E lembrei-me que foi uma boa sensação.
Entrei por aquela enorme porta bonita e comecei a olhar em meu redor... Era cinzento. Esquisito.

domingo, 17 de novembro de 2013

C'est la vie - #26

Quando chegámos finalmente à cidade, a minha ansiedade aumentou. Queria desesperadamente entrar na casa nova, ver como era. Ver o meu futuro quarto, planeá-lo com calma, construir novas ambições... Sei lá. Quando chegámos àquela rua que era um pouco familiar por já lá ter passado nas minhas férias, estacionámos o carro e começámos a descarregar as coisas para a porta do prédio. E eu como me sentia? Sentia-me estranhamente bem. Estranhamente feliz... Não percebo o motivo dessa felicidade, mas era assim que me sentia. Estava prestes a entrar dentro de casa. Estava em pulgas!
Chegou o momento. A chave entrou, rodou e a porta abriu-se. Um cheiro diferente mas acolhedor invadiu as minhas narinas. Sim, o cheiro não era nada semelhante ao da minha outra casa, mas era bom na mesma. Larguei as coisas e quando as palavras conseguiram sair, ainda se ouvia um eco. A casa ainda estava vazia, não tinha muita coisa. O suficiente para nos sentarmos, ver televisão... etc. A sala era a divisão mais cheia. Dois sofás, uma carpete, uma mesa de centro, um móvel onde estava a televisão e um móvel de canto. A minha mãe perguntou-nos se tínhamos fome. Eu não tinha muita. Talvez os nervos tivessem a dar conta de mim. Mesmo assim, ela fez-nos uma pizza. E comemos na sala. "Gostam da casa?"- perguntou a minha mãe, um pouco a medo. O meu irmão encolheu os ombros e eu respondi: "Adoro-a." Ela não parecia satisfeita com as respostas, mas decidiu ignorar. Eu disse-lhe aquilo com coração, juro.
Estávamos muito cansados, vestimos os pijamas e a minha mãe decidiu esticar o sofá-cama para dormirmos todos juntos. Assim foi. Ela foi a primeira a adormecer. Eu também já estava deitada, o meu irmão é que estava na casa de banho a pôr os seus cremes e a despachar-se para ir dormir. Quando agarrei naquele pequeno peluche branco e vi a mensagem que tinha no meu telemóvel, parecia um tsunami a vir do fundo do coração. Quando dei por mim estava a chorar como nunca na casa de banho agarrada ao meu irmão e a dizer: "Tenho saudades dele." Foi uma coisa tão rápida. Tão fora do normal. Chorei até adormecer.

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

C'est la vie - #25

Colocámos as malas no carro, demos dois beijos à amiga da nossa mãe, olhámos para cima e fizemos adeus à nossa avó que estava à janela de um 10º andar. Sentei-me no lugar da frente e o meu irmão atrás, acompanhado de um grande peluche que a minha madrinha me tinha oferecido. O carro começou a trabalhar e a minha mãe arrancou. Soou dois apitos do carro e as nossas mãos fora das janelas abanaram. Lembro-me de olhar para a minha mãe e vê-la a derramar-se em lágrimas. Meti um dos CDs da minha banda favorita a dar no carro. Fez-me esquecer tudo.
Foram umas longas horas de viagem, e quando chegou à minha vez de ir dormir um pouco, foi tiro e queda. Não me lembro de nem sequer forçar o sono. Acordei com um bater forte do coração, provavelmente estava a sonhar. O meu irmão, dormia no banco da frente. "Então, ele adormeceu?" - perguntei. "Sim. Veio para o banco da frente e adormeceu. Vamos parar para dormir." "Está bem..." - respondi. Caí no sono novamente e acordei com um calor abrasador. Estávamos numa estação de serviço algures em Espanha e o sol estava de frente para o carro, o que formou uma sauna ali dentro. Quando a minha mãe acordou e petiscámos qualquer coisa, metemos-nos à estrada novamente. Eu ia à frente novamente a cantar como uma fanática dos 30 Seconds To Mars. Eles animaram aquela viagem. Já estava a ficar cansada da viagem e ao final da tarde, prestes a sair de Espanha, parámos noutra estação de serviço. Estava a ficar frio e as nuvens cinzentas ocupavam o céu, deitando algumas gotas de chuva. Entrámos numa típica loja ao lado da bomba de gasolina. Com chocolates... Tudo e mais alguma coisa. A minha mãe pegou numas bolachas e fomos direitos ao carro. Eles foram à casa de banho enquanto eu permaneci encostada à nossa viatura. Montes de espanhóis com camisas das suas equipas favoritas, a falar aquela língua rápida que não se percebe nada. Aparentemente, ia dar algum jogo de futebol importante. Apesar dos espanhóis, via-se também, muitos carros portugueses. Afinal, não éramos os únicos naquele barco. Muita gente decidira sair do país. Compreensível...

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

C'est la vie - #24


Fomos jantar fora, para desanuviar um pouco. A comida estava óptima. O meu irmão triste mas toda a gente parecia esquecer um pouco a situação. Não me recordo como começou a conversa, mas surgiu uma pergunta perturbadora e marcante que até hoje continua a ecoar na minha mente e a fazer com que me arrependa de muita coisa. "Estavas a começar a gostar mesmo dele, não estavas?" Não cheguei a responder a tal pergunta. Fiz como faço cada vez que fico sem nada para dizer: desvio a cara e digo "não sei". Sei que tenho dito muitas vezes "e deu-me um aperto no coração", mas desta vez o meu nó na garganta apertou. Não soube o que responder. Talvez a resposta até fosse um redondo sim. Naquele momento, fiquei a matutar no assunto, mas sinceramente agora acho que foi estúpido. Passo a explicar: no lugar onde estava, não era o assunto certo a pensar. Se calhar pensar como enfrentar o 1º dia de escola fosse melhor que pensar numa coisa absurda. Ou, isso seria mais absurdo ainda? De qualquer forma, outras palavras me ficaram na memória: "A vossa mãe está a fazer isto por vocês. Portem-se bem." Acho que as pessoas não me vão compreender em certos aspectos quando falar no termo "mudança". Não se trata apenas de mudar de casa. Trata-se de muita mexida na vida. As coisas não são nem foram tão simples como parecem ou como podem parecer. 
A minha noite foi rápida, e no dia seguinte estávamos prontos a partir. Só aí é que me deixei umas lágrimas, porque não suporto de maneira alguma ver as minhas duas grandes mulheres da minha vida a chorar, uma por deixar a sua mãe sozinha e outra por ficar sem os seus netos e sem a sua filha. Apesar de não ter sido muito a água que escorreu pelo meu rosto, foi o suficiente para aliviar um terço do meu nó e dor de barriga. O resto ainda estava guardado, esperava evaporar-se com o tempo. A minha mãe tinha-me dito na noite passada, antes de ir dormir umas frases como estas: "Não importa quem cá esteja na altura de partir. Não importa quem seja. Não olhem para trás. Façam adeus, mas nunca olhem para trás." Ficámos curiosos e tocados pelas palavras ditas com algum brilho nos olhos da minha mãe e perguntámos o porquê de tudo isso. Dessa pequena regra. "Porque é assim..." - disse ela sem acrescentos. 
Era a altura de nos metermos dentro do carro e seguir viagem. 

 Continua...

C'est la vie - #23

A ansiedade aumentava a cada minuto.
Caímos no sono, ambos os 4. O dia seguinte tornou-se esquisito... Foi basicamente arrumar as coisas e despedirmos-nos de alguns familiares. Então, decidimos levar o David ao final da tarde. E assim foi.
Ao mesmo tempo que o fomos levar, foi a despedida do meu irmão e a Rafaela. Ainda o David, dentro do carro vimos-os a despedirem-se com um abraço de 5 minutos. A minha mãe ficou chorosa e emocionada, então juntou-se a eles. O meu irmão estava completamente fora de si, estava esquisito, nunca o tinha visto a chorar tanto. Será que eu iria reagir assim com o David? Fui levá-lo la a casa, também para me despedir da sua sobrinha pequenina. Ela fazia perguntas inocentes como: "Vais onde, Catarina?" E eu respondia sempre: "Vou viver com a minha mãe, muuuiito longe daqui. Mas nós vemos-nos, não te preocupes princesa." Quando me despedi da mãe do David ele afirmou: "Eu levo-te à porta." Saímos, fechou a porta de casa, abraçou-me e depois afastou-me para me dar um beijo, mas eu abracei-o e disse que não queria isso. Nenhum de nós chorou. Descemos a escada e disse-lhe: "Adeus."
Sentei-me no banco de trás do carro, e todos estavam chorosos. As lágrimas queriam sair, mas eu contia com tanta força, que acabei por ficar com uma dor de barriga e um nó na garganta. Mas mesmo assim, consegui ser a mais forte. Tentei distrair-me a olhar pela janela, tentando pensar noutras coisas. Era impossível...

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

C'est la vie - #21

Os dias seguintes foram bastante repetitivos. Acordar, despachar, almoçar, sair de casa, ir ter com o David e com o resto do grupo de amigos e despedir-me. Estava cada vez a ficar mais apertado. Sim, o meu coração. Não me sentia triste. Sentia-me livre... Mas ia deixar o meu melhor amigo, a pessoa que me apoiava em tudo e que não tinha medo de desabafar comigo. O que ia ser de mim? Será que ia aguentar a pressão de estar num sítio novo, sem conhecer ninguém e sem com quem desabafar?

Era a última noite. O meu primo convidou-me a mim, ao meu irmão e ao David para irmos dormir à casa dele na nossa última noite. Então fomos. Agarrei-me ao computador a jogar, para não pensar muito naquilo que se ia passar dali a umas horas. O David estava sentado a meu lado e observava-me. Eu evitava os seus olhos. Era fracções de segundos dolorosos quando os seus olhos me fitavam e às vezes cruzando-se com o meu olhar. A sua mão calorosa, juntou-se à minha. Entrelaçámos os dedos e senti-o a tremer. Estava nervosa, mas sabia que ele estava feliz por estar assim comigo.
Quando me deu o sono, fui para a sala ver televisão à espera de adormecer. Ele deitou-se ao meu lado e abraçou-me. "O que vai ser de mim sem ti?" - perguntou-me. Não lhe respondi, simplesmente abracei-o com mais força. "Fica comigo."- disse-me, quase implorando e com a voz trémula.